Ataúro
Parte 2
Volvidos 15 dias, eis que nos preparamos para um novo fim de
semana em Ataúro.
Devido a certas circunstâncias a ida para Díli foi feita num
jipe alugado. A meio do percurso, ao aproximarmo-nos de uma zona em obras
deparámo-nos com um corte de estrada. Nada mais natural! Já não chegavam os
buracos, as depressões na estrada, as crateras formadas pelas obras e pela chuva
que insistentemente caía, enormes pedregulhos cortavam-na impedindo a
circulação em ambos os sentidos! Foi-nos dito que o manobrador da máquina fora a
casa comer e dormir a sesta. Não nos restava outra coisa se não esperar que
acordasse. Como disse um amigo: hilariante!
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As obras na estrada |
A fila ia-se formando de um e do outro lado da via.
Entretanto, pequenas pedras, transportadas ao ombro, mudavam do lado direito
para o lado esquerdo da estrada. Cerca de 45m depois, depois da soneca, os pedregulhos
deixaram de ser um empecilho no nosso caminho.
Com imensa paciência, o motorista ia aturando os nossos
desabafos. E contou-nos alguns episódios da sua vida: fora um lutador da
resistência, assistiu a massacres, inclusivamente de familiares e até nos
mostrou um vídeo dos acontecimentos de 2006. Ele próprio tinha marcas das
lutas. Mas mantinha um semblante risonho. Perguntámos: Como é possível ter
passado por isso tudo e continuar com um ar aparentemente feliz? Limitou-se a
sorrir. Gosta de Portugal, é descendente de portugueses e irá para lá estudar.
Oxalá consiga atingir os seus objectivos. Pediu que lhe trouxesse uma camisola
do…Sporting. Farei o possível. Tem uma de cada um dos mais importantes clubes
portugueses.
Chegadas a Díli, compramos pão e bolas de berlim da Padaria
Brasão para fazermos uma pequena refeição com alguns dos produtos portugueses a
que já nos habituámos.
No dia seguinte, acordámos cedo porque o barco rápido partia
às 7h 30m. A agitação do mar e a velocidade do barco fez-me lembrar a minha
primeira e última viagem às Berlengas. A maior parte do percurso foi feita sob
alguma tensão, sempre com os olhos atentos à água e à espuma provocada pelo
deslizamento do barco. Ao aperceber-se do meu receio, o dono (Jens) mandou
reduzir um pouco a velocidade. A última terça parte da viagem foi feita de uma
forma mais descontraída não só devido à aproximação da ilha mas também devido à
companhia das minhas colegas. Disse ao Jens que não viajaria mais com ele! Que
preferia a lentidão do Nakroma! E ele ria. Haveria de o encontrar mais vezes no
eco-lodge e iria repetir o mesmo.
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A vista da varanda da cabine é fantástica. |
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O quarto devidamente equipado com redes mosquiteiras |
Atracamos em Ataúro e somos convidadas a tomar o 2º pequeno
almoço do dia enquanto acabam de preparar a “cabine”, como lhe chamam, onde
ficaremos alojadas. Trata-se de um eco-resort onde existe a preocupação de
manter o equilíbrio entre a natureza e o homem. As casas encontram-se a
distâncias ideais de modo a manter a privacidade dos hóspedes. Os caminhos
pedonais ladeados por belos canteiros floridos são constantemente visitados por
borboletas e outros insectos que procuram neles a sua fonte de alimento. E os
arbustos aparentemente selvagens são o
refúgio de algumas aves que fazem o encanto de quem está a tomar as suas
refeições, a ler nos vários livros colocados à disposição do cliente ou
simplesmente a descansar debaixo da cobertura principal.
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Uma "nesga" de paisagem |
Devidamente instaladas, apreciamos a beleza da paisagem
envolvente mas, o mar, esse continuava agitado, a revolver a areia e a trazer
lixo para a praia.
Com o aumento da intensidade do vento, não era conveniente
tomar banho mas pequenos locais de descanso mesmo de frente para a praia serão
o local ideal para ler e descansar, sobretudo. Levantar cedo para ver o nascer
do sol na praia ou tomar banho depois do pôr do sol foram momentos agradáveis.
Houve tempo para usar um par de óculos feito em madeira e com eles mergulhar e
ver estrelas do mar. Aos poucos, o meu medo da água vai-se dissipando. Gostei,
senti-me à vontade e, quando houver oportunidade, irei repetir a sensação.
Nas noites que lá ficámos havíamos de ser
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O grupo de música tradicional de Ataúro |
presenteados por
sessões de Karaoke e música tradicional de Ataúro no decorrer de um encontro
sobre a mulher trabalhadora.
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O jardim |
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A tenda de campismo |
No dia previsto para o regresso aconteceu mais uma surpresa:
simplesmente, o Nakroma não fez a travessia e nós, que já tínhamos feito o
check out, fomos obrigadas a ficar mais um dia mas desta vez numa tenda de
campismo para duas pessoas mas onde tiveram de caber 3.
É que o dinheiro também estava a escassear. Houve necessidade de arranjar alternativa ao transporte do ferry
recorrendo a um dos barcos rápidos. O regresso a casa far-se-ia na biskota
alugada por esse grupo de mulheres que, por coincidência do destino, se
dirigiam precisamente para Maliana.
Andar de biskota é
uma experiência única. Viaja-se num transporte que leva cerca de 25 pessoas com
as portas e janelas abertas para que o ar circule (não há maus cheiros, até
porque há desodorizantes de ambiente dependurados aos pares), com o estreito
corredor cheio de bens transportados da capital.
Pára-se inúmeras vezes. Para deixar entrar ou sair
passageiros, para colocar mais um ou dois sacos de arroz, para comprar o sal e
o peixe que fazem falta e que se coloca no tejadilho da mesma, para almoçar num
local de restaurantes improvisados, etc.
O pior foi o que aconteceu a seguir. Nunca fico mal disposta
em viagem, não era suposto vomitar mas, o inevitável aconteceu. De Batugadé até
casa foi um contínuo de má disposição e vómitos. Já não havia mais nada para
deitar fora e viagem nunca mais acabava.
Chego a casa, estafada e coberta do pó que entrou durante
todo o percurso.
Quero agradecer a amabilidade
do grupo de mulheres de Maliana, na pessoa da Argentina, que prontamente se
disponibilizou a dar-nos boleia numa biskota com todos os lugares esgotados. Ao
longo da viagem, não fomos “malae” (estrangeiras) mas sim “manas” (senhoras). Obrigada